O que levou o republicano Donald Trump a estar muito perto de ser confirmado como o próximo presidente dos EUA?
Para 39% dos eleitores americanos, segundo a pesquisa de boca-de-urna da agência de notícia Associated Press, a economia foi o tema decisivo desta eleição.
Isso significa principalmente a inflacção. Em junho de 2022 o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) dos EUA atingiu 9,1% (no acumulado de 12 meses), o maior desde 1981. Isso foi um choque para os americanos, especialmente os jovens adultos, que nunca tinham visto nada parecido.
A inflacção hoje está sob controlo, mas os efeitos continuam sendo sentidos por uma parte importante da população, em termos de perda de poder aquisitivo.
Esse pico inflaccionário foi em parte causado por um factor externo: o desarranjo nas cadeias globais de produção provocado pela pandemia de covid-19. Mas houve também dois factores internos: o excesso de estímulo (isto é, de gasto público) aprovado pelo presidente democrata Joe Biden e a demora do Fed (o banco central americano) para elevar a taxa de juros.
O Fed minimizou a alta inicial da inflacção, por achar que se tratava de um fenómeno passageiro. Esses dois erros, de política fiscal e monetária, acabaram por custar caro para os democratas.
O segundo tema decisivo, ainda segundo a pesquisa da AP, foi a imigração apontada por 20% como o tema decisivo. O eleitorado americano puniu a entrada descontrolada de imigrantes pela fronteira com o México nos três primeiros anos de governo Biden. Quando Biden reagiu, tardiamente, apercebeu-se que o estava a fazer apenas de olho nas eleições.
Havia assim uma grande expectativa de mudança, e Trump apresentou-se como o candidato da mudança, como quem iria resolver esses problemas. Para a democrata Kamala Harris, vice de Biden, era difícil se livrar do legado do actual governo.
Só isso deveria bastar para o candidato republicano obter uma vitória confortável. Mas a elevada rejeição de Trump possivelmente tornou a disputa mais apertada do que seria normalmente.
Por fim, os democratas erraram quase tudo o que podiam errar nesta campanha eleitoral. Em primeiro lugar, não conseguiram barrar a candidatura à reeleição do presidente Joe Biden, que disputou e ganhou as primárias do partido.
A aprovação de Biden é muito baixa e seria improvável que ele derrotasse Trump, mesmo no melhor da sua forma física.
O presidente só foi convencido a desistir no final de julho, depois que o seu desempenho desastroso no primeiro debate com Trump escancarou o que os eleitores americanos já vinham afirmando em todas as pesquisas: que ele era velho demais para ser candidato. Nunca um partido trocou de candidato tão tarde na disputa presidencial. E nunca um partido que trocou de candidato venceu.
Então havia o problema de quem substituiria Biden. Àquela altura era politicamente muito difícil travar a candidatura da vice-presidente Kamala. Mas ela era desde início uma aposta muito arriscada. Foi um dos vice-presidentes mais apagados da história recente dos EUA e não ganhou estatura política.
Ela é da Califórnia, e os democratas nunca elegeram um presidente da Califórnia, que é considerado um Estado muito esquerdista. Além, claro, de ela sofrer duplo preconceito, por ser mulher e por ser negra. É possível que o facto de ser mulher tenha facilitado para Trump atrair o voto de homens latinos e negros, o que possivelmente foi decisivo na eleição.