O conflito entre a Ucrânia e a Rússia marca o início da definição de uma nova era mundial e faz cair por terra a teoria de Francis Fukuyama do fim da História mas mais do que isso, representa a consciência da dependência das cadeias produtivas globais e os esforços para o fim dessa dependência, já exarcebados pela pandemia da COVID-19 e os insumos médicos globais que afectaram a soberania dos países. Por isso, a economia está no centro da Nova Ordem Mundial, causada pela disrupção dos circuitos do comércio internacional.
A última Cimeira dos BRICS (grupo de países de economias emergentes constituído pelo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) resultou na entrada de 5 novos países, nomeadamente Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egipto, Etiópia e Irão, e por causa desse alargamento o grupo representa agora 6 dos 9 maiores produtores de petróleo do mundo (Rússia, China e Brasil, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Irão).
Os países ocidentais sentem o peso internacional do agrupamento, que pode fazer oscilar a balança de poderes, sobretudo porque se assiste à crescente manifestação de interesse em aderir ao grupo, que actualmente representam mais de 42% da população mundial.
O Novo Banco de Desenvolvimento, criado para apoiar as economias dos BRICS, liderado pela Presidente brasileira Dilma Rousseff, assume-se como potencial alternativa para financiamentos de projectos de desenvolvimento nacional ou dívida pública, em oposição ao papel tradicional das instituições financeiras internacionais e apoia sobretudo os sectores de infraestruturas de transporte e sociais, recursos hídricos e saneamento, entre outros sectores-chave para o desenvolvimento.
Quando aplicadas a Angola, as características socioeconómicas dos BRICS adaptam-se se tivermos em conta a grande extensão territorial do país em África; a disponibilidade de mão-de-obra jovem e de oferta de matérias-primas e o facto dos países que compõem o grupo serem pólos de desenvolvimento regional. Pelo seu forte pendor económico na busca por uma actuação conjunta para o desenvolvimento mútuo, facilmente se deveria encontrar alinhamento com a política do actual governo angolano. Acresce que os países dos BRICS são neste momento os maiores parceiros comerciais de África.
A História já demostrou a Angola a importância da cooperação sul-sul, porquanto no final da guerra civil, em 2002, quando a Comunidade Internacional deveria ter apoiado o país através da realização de uma Conferência de Doadores e não o fez, foi a China que apareceu para apoiar o esforço pós-guerra.
Os BRICS possuem potencial para se tornarem numa Organização de Cooperação Sul-Sul e seria mais prejudicial para Angola estar ausente desse projecto. A História também já demonstrou que o ocidente não representa a solução para os problemas dos países em desenvolvimento e até ao momento as políticas impostas pelo capitalismo dominante do Norte tem apenas aumentado o fosso entre os países do Norte e o Sul Global.
O facto de Angola não ter estado presente ao mais alto nível na Cimeira de 2023, denota que as prioridades do país não passam, pelo menos por enquanto, pelo ingresso no grupo, contrariando o anúncio de 2018, em que se manifestou interesse na adesão.
As notícias que têm vindo a público não deixam dúvidas da clara mudança nas prioridades da política externa angolana com ênfase na diplomacia económica com o ocidente, consubstanciada na aproximação aos EUA, que têm concebido empréstimos a Angola indissociados aos habituais condicionalismos democráticos, desajustados à realidade africana.
No jogo de poderes da Nova Ordem Mundial, os blocos económicos reconfiguram as relações internacionais e as plataformas do Sul Global são os pilares da reconfiguração dos poderes mundiais. Quererá Angola ficar de fora?
Neste momento, a Rússia é quem mais beneficia do fortalecimento dos BRICS, representando um escape às sanções impostas pelos EUA decorrentes da guerra com a Ucrânia, enquanto possibilita a sua defesa junto de organizações internacionais e também a China fortalece o seu poderio económico. Contudo, os benefícios de pertença aos BRICS superam o interesse de apenas um ou dois países e os seus membros ampliam as suas influências nos fóruns geopolíticos mundiais. Não é despiciendo que em todas as Declarações, os BRICS façam alusão à importância de conceder maior voz e participação na governança mundial, numa altura em que se torna cada vez mais real a tão almejada reforma da ONU e a inclusão de 2 assentos permanentes para os países africanos no Conselho de Segurança da ONU. Será de todo o interesse para Angola que a Rússia e a China apoiem uma eventual candidatura, justíssima, pelo reconhecido papel na manutenção da paz e segurança no continente.-
Dilma Esteves